A patologia é uma área de estudo focada nas reações dos tecidos do corpo a lesões e a agressões como infecções e intoxicações. Especificamente, trata-se dos processos de degeneração (acúmulo de substâncias nas células), cicatrização tecidual, morte celular, inflamações e formação de tumores e cânceres. No contexto da paleontologia, teria como estudar, por exemplo, os processos inflamatórios que acometiam, em vida, os animais já extintos, dos quais se tem apenas registros fósseis? As doenças com as quais eles conviviam? Esse é o campo de estudo da paleopatologia. Trabalhos paleopatológicos buscam descrever doenças e injúrias dos animais do passado, a fim de melhor entender a fisiologia das espécies, causa de manifestações patológicas e, até mesmo, o ecossistema já extinto do qual eles faziam parte.
Registros fósseis bem conservados de um indivíduo da espécie Majungasaurus crenatissimus, dinossauro carnívoro da família Abelisauridae que viveu no Cretáceo, encontrados em Madagascar, revelaram processos patológicos por marcas nos ossos. Seus ossos jugal e quadratojugal direitos, parte do crânio de répteis, apresentam superfície rugosa, com crescimento hipertrófico e fossas adicionais; essas características apontam para uma infecção bacteriana ou fúngica, provavelmente osteomielite. A quinta vértebra cervical apresenta marcas de dente, ou seja, o indivíduo estudado sofreu um ataque de outro carnívoro. Essas marcas estão preservadas com limites arredondados, o que indica que a lesão foi regenerada. A parte dorsal de suas costelas, nas costas do animal, também apontam para processos de cicatrização, uma vez que apresentam formação de calos e mudança na textura do osso. Os membros anteriores contém diversas alterações, como hipertrofia, marcas de morte celular e calcificações onde existiam tecidos moles, que apontam uma possível artrite séptica, outro tipo de infecção, dessa vez nas articulações. A variação de tipo e local das lesões indicam que elas não foram causadas em um único evento.
Estudos desse tipo precisam considerar importantes parâmetros para definir se uma alteração no fóssil é resultado de um processo patológico ou não. Dentre outros critérios, as peças devem ter boa qualidade de preservação, além de estarem em um sítio paleontológico onde vários indivíduos da mesma espécie foram encontrados bem preservados. Essas considerações refinam as observações realizadas pelos paleontólogos, pois permitem comparações intraespecíficas, que descrevem a morfologia padrão da espécie, e a análise de processos tafonômicos (pós morte).
Estudar as patologias que acometeram os dinossauros em vida, não apenas a causa de sua morte, é importante para entender o funcionamento do organismo desses animais e, até mesmo, suas interações com microrganismos. O estudo em questão pôde demonstrar que uma população saudável de M. crenatissimus possui indivíduos com múltiplas patologias, principalmente infecções e regeneração de lesões, elucidando alguns fatos sobre a ecologia e a fisiologia desses animais.
Fonte: Gutherz, S.B., Groenke, J.R., Sertich, J.J.W., Burch, S.H., O’Connor, P.M., Paleopathology in a nearly complete skeleton of Majungasaurus crenatissimus (Theropoda: Abelisauridae), Cretaceous Research, https://doi.org/10.1016/j.cretres.2020.104553.